A tarde chuvosa de Porto Alegre não impediu mais uma manifestação histórica dos povos originários no centro da cidade contra o Marco Temporal – tese jurídica racista e colonial, que, se aprovada, questionaria demarcações de terras indígenas efetivadas depois de 1988.
A tese do Marco Temporal teve seu julgamento transferido no Supremo Tribunal Federal, sem data prevista para voltar à pauta. Era para ser nesta quinta (23), quando o ministro Alexandre de Moraes retomaria seu voto. O ato em Porto Alegre foi uma das manifestações pelo Brasil neste dia 23, porque os povos entendem que quanto mais se estende o julgamento mais aumenta as negociações e a pressão dos latifundiários sobre os ministros. Também aumentam os ataques diretos aos territórios e a quem os defende.
Para se ter ideia do nível:
Na noite de ontem, véspera do que seria o julgamento, Bolsonaro se encontrou a portas fechadas com o ministro Alexandre de Moraes, que retomaria o voto hoje. Tiveram este encontro privado (do que será que trataram?) na casa de um dos mais articulados negociadores do momento, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira. Lira deu um jantar em homenagem aos 20 anos de Gilmar Mendes na corte do STF. Gilmar Mendes é um dos últimos ministros a votar sobre o Marco Temporal. Seu voto pode ser decisivo. O que falam nestes quartos fechados? O que negociam? Representam a quem com suas decisões?
Os povos originários estão com seus corpos e territórios sob ataque desde 1500. A aprovação do Marco Temporal seria uma ofensiva colonial contundente contra a vida dos indígenas. Contra a vida.
A guerra está posta, não só em defesa dos territórios indígenas, mas em defesa da vida, da humanidade e da Natureza. Especialmente nós, branquitude, quando vamos transformar com urgência nossas prioridades e nos colocar de fato nesta guerra? Colocar o corpo em frente a quem é atacado, fortalecer territórios retomados com grana, sementes e mãos, praticar outro tempo e outro cuidado.
Ou seguiremos levantando nossas bandeiras que, em última instância, vão acabar sabotando as revoltas e fortalecendo o sistema de negociatas entre latifundiários, militares, Bolsonaros, Liras, Moraes, Mendes ou quem mais vier nestas estruturas coloniais que são STF, Câmaras, Palácios. A luta é no território. A começar pelo corpo. Território, alimento e autodefesa.
Um salve a Bruno e Dom, que assim como muito nestes países, caíram lutando em defesa da vida.
Veja mais registros do ato. Fotos de Alass Derivas | @derivajornalismo:
A mobilização dos Povos Indígenas em Porto Alegre contou com a participação de cerca de 200 pessoas das comunidades Mbya Guarani, Kaingang, Xokleng de São Francisco de Paula – Retomada Xokleng Konglui, Canela – Retomada Kaingang, Bento Gonçalves- Kaingang, Maquine – Retomada Ka’aguy Porã e Som dos Pássaros, Viamão – Jataity do Canta Galo, São Leopoldo-Kaingang e Porto Alegre – Kaingang do Morro do Osso, Lomba do Pinheiro, Lami e, ainda, centenas de pessoas de entidades e movimentos sociais, sindicais, populares e da Frente Quilombola do Rio Grande do Sul.
A manifestação também pediu a saída de Marcelo Xavier da presidência da FUNAI.
Abaixo, veja a fala de Woie Xokleng, uma das lideranças que puxou a retomada da Casa do Estudante Indígena da UFRGS:
E do Jamaica Machado, do Quilombo dos machado, em solidariedade aos povos originários na luta contra o Marco Temporal:
Alass Derivas | @derivajornalismo
23 de junho de 2022
20h
Porto Alegre – RS
Contribua com a viabilização desta minha participação e desta cobertura. Considere fazer um p i x ou assinar o financiamento contínuo.
https://www.catarse.me/derivajornalismo
Entre no canal do Deriva no Telegram. Receba direto os conteúdos, para além dos algoritmos. Só clicar no link na bio.
https://t.me/derivajornalismoefoto