Aula pública e ato no INCRA marcam mobilização em defesa de territórios quilombolas

Aula pública e ato no INCRA marcam mobilização em defesa de territórios quilombolas

Publicado no Sul 21

Texto e fotos Alass Derivas

Representantes da luta quilombola participaram de aula pública no Sindicato dos Municipários de Porto Alegre. Foto: Alass Derivas

Representantes da luta quilombola em Porto Alegre promoveram, terça-feira (5), uma manifestação em defesa dos territórios, que contou com uma aula pública no Sindicato dos Municipários de Porto Alegre (SIMPA) e uma ação no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) exigindo um encontro com o superintendente do órgão para saber sobre o andamento do processo de titulação de quilombos como o dos Alpes, Fidélix, Areal e também Morro Alto.

O ato fez parte de uma mobilização nacional com ações também na Bahia e no Maranhão. Em Porto Alegre, contou com a presença de representações das comunidades quilombolas urbanas, referências de matriz africana, membros da universidade e integrantes e apoiadores da Frente Quilombola RS. No INCRA, foi entregue um documento de reivindicações e denúncias de violações nos territórios (ver íntegra do documento no final do texto).

A tarde de mobilização começou com dezenas de pessoas se reunindo no SIMPA para a “Aula Pública em defesa dos territórios”. A mesa do evento foi composta por Professor José Carlos dos Anjos (LUTA/UFRGS), Onir Araújo (Advogado/Frente Quilombola), Cláudia Pires (NEGA/UFRGS), Mãe Pati de Oxum e Ossanha, Marlise Marques (Comitê da Saúde da População negra), Mestra Janja (Quilombo dos Alpes), Dona Lígia (Quilombo dos Silva) , Sandro Lemos (Quilombo do Lemos), Luís Machado (Quilombo dos Machado) e Geneci Flores (Quilombo dos Flores).

Na sua intervenção, o professor José Carlos dos Anjos (LUTA/UFRGS) disse que ainda não se falou o suficiente sobre o quanto o ódio racista levou o presidente Jair Bolsonaro ao poder. “Quando a gente começou a fazer luta dentro das regras dos jogos deles, eles não tiveram o menor pudor em desmanchar tudo de decente. Desmantelaram tudo das instituições democráticos. É preciso que tenhamos em mente isso. Para resistir às nossas lutas, eles, racistas, não hesitaram em chegar até o limite, de colocar um incendiário no poder para frear nossas aspirações democráticas. Pois não nos suportam dentro das democracias, porque o nosso lugar para eles é o campo de extermínio, que são as favelas, onde a polícia entra e mata. É ali que eles nos querem. É do lado de fora da nação, é onde eles podem chegar com os capangas e varrer a tiro os quilombolas. Hoje quem mais morre nas lutas do campo do país não são mais lideranças do MST, são lideranças indígenas e quilombolas. A democracia é um governo de ricos e nós estamos de fora. Quando exigimos o ingresso na democracia, eles não hesitaram, hoje, assim como nas outras ditaduras, em provocar a derrocada de toda institucionalidade democrática para nos impedir, povo negro. Mas vivemos isso há cinco séculos e nós não vamos recuar. Vamos continuar avançando. O maior indicativo de democracia nesse país é quando um negro for um cidadão como qualquer outro cidadão. E nós não somos.”.

Para Mãe Pati de Oxum e de Ossanha, da Vila Mapa, não é uma pessoa, não é um terreiro, é toda uma nação que eles querem destruir. “É todo um povo, que tem por trás uma tradição, tudo aquilo que a gente sabe que toca o nosso coração. E é por isso que a gente está nessa luta. Então, não vai ser tão fácil assim para nos destruir. O que nos resta é a união, porque já temos as forças dos ancestrais, a força dos orixás e agora vamos nos reunir com a força de toda essa negrada que não é pouca”.

No INCRA, foi entregue um documento de reivindicações e denúncias de violações nos territórios. (Foto: Luiza Dorneles/Amigos da Terra Brasil)

Na sequência da aula, aconteceu uma caminhada até a frente do INCRA. Ali, se exigiu, ao som do tambor, uma reunião com o superintendente do órgão, Tarso Teixeira. Após alguns minutos, Tarso recebeu uma comissão com representantes dos territórios quilombolas, professores, referenciais de Matriz Africana, com a presença da vereadora Karen Santos. O advogado Onir Araújo entregou a pauta reivindicação que trazia em destaque três pontos. A necessidade da criação de uma força tarefa de defesa em relação ao quilombo de Morro Alto, ameaçado por pedreiras ilegais e loteamentos imobiliários. A exigência de relatórios sobre a situação da titulação de quilombos como o do Areal, Fidélix, Alpes. E o pedido que o INCRA se posicione em defesa das comunidades quilombolas frente aos projetos de mineração, como a Mina Guaíba e as mineradoras que pretendem se instalar em São José do Norte, Camaquã, Delta do Jacuí. O processo de licenciamento ambiental desses empreendimentos não consultou as comunidades, o que desrespeita a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, que o Brasil é signatário.

Como resposta, os representantes do INCRA expuseram a situação de sucateamento do órgão e destacaram que estão submetidos à Brasília. Ainda assim, se comprometeram a participar de uma reunião com o Ministério Público, Ibama e Fepam no Quilombo de Morro Alto, ainda em novembro e pediram que os relatórios fossem exigidos por ofício.

As representações quilombolas entregaram a carta de reivindicações e avaliaram, pós reunião, ter sido a recepção mais fria já recebida no órgão. Por isso mesmo, anunciaram se manter mobilizados para seguir cobrando.

Tanto a aula pública quanto a reunião no INCRA foram transmitidas ao vivo e estão disponíveis na íntegra na página do Facebook da Frente Quilombola RS.

Leia a carta da Mobilização em Defesa dos Territórios: http://bit.ly/CartaFQ

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *