No mês de maio deste ano, cedi, sem consentimento das pessoas envolvidas, o uso de uma fotografia para o projeto “Poa Ancestral, muito além de 250 anos”. A imagem é um registro de um abraço entre a Gah Té Kaingang e a Iyamoro, da Comunidade Kilombola Morada da Paz, em um ato político durante a ocupação da Casa do Estudante Indígena da UFRGS, em março de 2022. A foto foi usada em aulas online e na capa de E-book do projeto.
No dia 25 de outubro me reuni com o Conselho de Ìyas e Bàbá da Comunidade Kilombola Morada da Paz e escutei sobre os efeitos que esta minha atitude causou na comunidade. Como reparação, recebi o pedido deste comunicado público.
Por suposições equivocadas da minha parte, dispensei a consulta antes de liberar o uso da imagem. É responsabilidade do fotógrafo perguntar sobre o direito de imagem às pessoas fotografadas. A consulta prévia é básica e, no que se refere a comunidades como a Morada da Paz, consta inclusive na Convenção 169 da OIT. Ao não mostrar a fotografia no ato e ao não pedir permissão para publicar no Deriva Jornalismo e, posteriormente, no projeto Poa Ancestral, errei. Com isso, expus a comunidade de forma inesperada, o que fez com que as pessoas envolvidas se sentissem invadidas e vulnerabilizadas.
Este episódio me faz refletir com maior profundidade sobre como tenho tocado o trabalho do Deriva Jornalismo até aqui. Reavalio minha ética na fotografia, o que diz respeito a apropriação, ambições, necessidades, contribuições, memória, exposição, branquitude, entre outros pontos. E também penso sobre o como – mesmo me colocando como aliado, a serviço dos povos indígenas, do povo negro -, é preciso ter muita atenção, cuidado e respeito para não ser um desserviço para as lutas ancestrais e um favor ao colonialismo.
Desde o ocorrido, principalmente, depois de escutar o Conselho de Ìyas e Bàbá, tenho buscado colocar o consentimento como primordial, antes do fotografar, inclusive em espaços públicos. O escutar atento, inclusive sobre demandas que por vezes não se sente ou momentos que é melhor silenciar, se retirar. Este acontecimento serve como aprendizado, para que situações semelhantes não voltem a acontecer, nem com a Morada da Paz nem com outras comunidades. Serve de aprendizado profundo na busca de cada vez mais fortalecer, de fato, a luta dos povos com o fazer de registro do Deriva Jornalismo, que é o que faz sentido neste trabalho. Sigo aberto ao diálogo com a comunidade e com quem quiser falar sobre o assunto.