Aldeia Guarani denuncia invasão e loteamento do território indígena

Aldeia Guarani denuncia invasão e loteamento do território indígena

No bairro Lami, extremo sul de Porto Alegre, quem passa pela Estrada Otaviano José Pinto não percebe o que acontece por trás da mata. Pequenos buracos tapados com galhos são discretos e camuflam a entrada das pessoas que, há aproximadamente 15 dias, invadem e promovem um esbulho possessório do território da Aldeia Pindó Poty. Já são quatro lotes cercados, dois deles com barracos. Nas laterais dos lotes, mais varas estão sendo levantadas e arames estendidos. Se não fosse a denúncia feita pela comunidade guarani na semana passada, acionando apoiadores, parentes indígenas e o poder público, é provável que o loteamento, com o desmatamento da mata nativa, seguiria à toque de caixa. 

Na manhã desta segunda, estivemos na aldeia fazendo mais um registro da invasão. No interior de um dos casebres, nenhuma mobília, vestígio de ocupação humana. Apenas uma foice, um rastelo, arame e arame farpados; materiais usados para desmatar e para cercar. A suspeita é que o território indígena esteja sendo loteado para, em breve, com a posse estabelecida, seja especulada por setores comerciais. Nesta manhã, nenhuma presença humana, apenas roupas no varal, que parecem terem sido estendidas propositalmente para simularem a ocupação.  

Ao fotografar na rua Otaviano José Pinto, fomos hostilizados por dois homens que se encontravam dentro do Centro Comercial ao outro lado da rua da área loteada. Sem serem perguntados, gritavam, entre palavrões, que se fotografássemos as lojas íamos ser processados e que o centro comercial tinha escritura. Que a gente deveria cuidar da nossa vida, que se não íamos tomar uma “camaçada de pau”. Na quinta-feira, o Conselho Missionário Indigenista (CIMI) registrou a invasão. Naquele momento, um homem e uma mulher desmatavam a área. Indagados, estavam cientes que o território é área indígena. “Então por que estão invadindo?” “Para guardar o terreno”, responderam friamente, com foice e facão na mão.

A situação é delicada. A Aldeia Pindó Poty não está demarcada ainda, o que o cacique Roberto Ramirez considera urgente que aconteça. Procurada na sexta-feira, a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) alegou não poder fazer nada sobre a invasão justamente pela área não estar demarcada. O Ministério Público Federal, através do Procurador Jorge Irajá Louro Sodré, se comprometeu a entrar com pedido de reintegração de posse, o que não aconteceu até o momento.

Nesta manhã o cacique Roberto recebeu a visita de Élio, vindo da Aldeia Som dos Pássaros, do município de Maquiné. É o começo da chegada dos parentes guaranis, que virão esta semana em solidariedade, de corpo presente, para pensarem como proceder sobre a situação. Roberto, há 12 anos no Lami, vem depois de Cacique Pedro, Cacique Valdomiro, Cacique Sebastião. Este último, já falecido, chegou no território na década de 40. A Aldeia Pindó Poty está em um território ancestral. Compõe junto com as aldeias do Cantagalo, Itapuã, Ponta do Arado, Lomba do Pinheiro uma grande área de circulação e de ocupação deste povo originário nas matas da Zona Sul da cidade de Porto Alegre.

Nesta segunda-feira, a comunidade recebeu a visita de vereador, assessores parlamentares e representantes de diversos movimentos. Algumas pessoas sugerindo ações precipitadamente, desconsiderando a vulnerabilidade de segurança da comunidade e a autodeterminação do povo guarani. A comunidade neste momento é constituída por sete famílias, a maioria crianças. Então é imprescindível seguir, nos próximos dias,  o apoio e a vigília. Com uma dedicação a mais na escuta e no ímpeto branco colonizador de sugerir o proceder aos guaranis diretamente envolvidos e de usar a causa indígena para autopromoção. É imprescindível que o poder público haja imediatamente em defesa desta comunidade, impedindo o desmatamento e qualquer violência que os indígenas possam sofrer após estas denúncias.

Escute o Cacique Roberto Ramirez:

Veja mais fotos:

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1 comment

Ótima matéria de denúncia (texto e fotos), factual, sensível e posicionada; apenas o áudio ficou inaudível. Pode incluir ao final formas concretas de apoio e contato p/ acompanhamento por parte d@ Cidadã@ comum (“mobilização” > envolvimento para ação).

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