Aqui estão registros do mutirão solidário que aconteceu na Aldeia Água Vermelha, território do povo Pataxó Hã-hã-hãe, em Pau Brasil (BA), dos dias 27 ao dia 30 de janeiro de 2022. A ação, puxada pela Teia dos Povos da Bahia, foi possibilitada pela campanha de financiamento de reconstrução dos territórios atingidos pelas fortes chuvas. Foi momento de subir floresta, um passo em direção à soberania alimentar. Um momento de fortalecimento da Pajé Rita Muniz.
Rita, pajé do povo Tupinambá, devido a uma perseguição com teor religioso, estava, com seus três filhos mais novos, retirada de sua casa há alguns dias. Por se sentir insegura devido à intolerância religiosa proferida por parentes evangélicos dentro da aldeia se refugiu no Assentamento Terra Vista. “Ser chamada de bruxa, de feiticeira. Você não poder cantar seu ritual dentro da sua comunidade com alegria. Mas esse mutirão mostra que nossa força está no que a gente busca, que é a terra, a sobrevivência na terra. A luta é por ter liberdade na terra, por amor à terra, que é nossa casa, nossa, luz, nosso guia. Sair daqui não foi abandonar minha terra, porque aqui é meu futuro, meu presente e meu passado. Não se deixa, nem se abandona sua história. Fui nomeada pajé pelos encantados e eu acredito nessa força dos meus ancestrais. Nenhuma intolerância religiosa, nenhuma guerra contra mim, contra minha espiritualidade, minha pajelança, meus rituais de cura, de força, de luz, nada vai tirar isso de mim. É minha vida, é meu sangue”, defende com tranquilidade e firmeza, Rita.
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Era a primeira das chuvas que nos regou no meio dos três dias de mutirão da Teia dos Povos na Aldeia Vermelha.
Gah Té, kujà kaingang, saiu debaixo da sombra da ciriguela e foi sentir na pele as gotas que caiam.
Antes disso, a pae do povo Kaingang, saiu de Porto Alegre para vir conhecer as parentes na Bahia. Primeiro Jaçanã Pataxó, na Aldeia Velha. Agora chegava para conhecer Rita Muniz Tupinambá. Duas gerações de pajés. Um amor repentino no encontro carnal. Um amor de outros tempos, que se vê, se sente, mas não sei explicar.
Emoção sem tamanho nesse banho de chuva cúmplice, compartilhado. Olhe as expressões de Rita e Gah Té.
Uma honra sem tamanho a permissão do registro deste momento.
Salve as mulheres indígenas, curandeiras, rezadeiras! Salve os saberes ancestrais que nos conectam à cura e aos encantados, que resistem à intolerância religiosa e ao genocídio. Salve o caminho da luta pelo direito à natureza e à vida.
No dia 29, Maria Muniz esteve presente no mutirão, trazendo toda sua força e seu apoio à Rita. Momento emocionante! Maria, além de irmã de rita, é mestra de saberes tradicionais, guardadora de sementes, referência na educação indígena. Recentemente lançou, pela editora da Teia dos Povos, o livro “A escola da reconquista”, em que traz relatos, do seu lugar de professora, das retomadas do seu povo no sul da Bahia. Maria esteve em cada uma das 396 áreas retomadas pelos indígenas entre 1982 e 2012. Depois de anos de luta, os 54 mil hectares do território Caramuru Catarina Paraguassu, no sul da Bahia, estão hoje reconhecidos e demarcados. Estas memórias estão no livro de Maya, como também é conhecida. A Aldeia Vermelha, território da pajé Rita, é uma das áreas do território Caramuru Catarina Paraguassu. Abaixo, o momento do encontro das irmãs. “Aqui tem a força de nossos encantados e nada de mal poderá atingir este território”, falou Maria na abertura do dia 29, antes de começar a cantar para Ogun.
Além da Gah Té Kaingang, mais pessoas compunham uma caravana do sul do país, como integrantes do Junana, território do município gaúcho de Maquiné que integram a Teia dos Povos em Luta no Rio Grande do Sul. Com eles, um bocado de sementes, ofertados como presente à Rita e à Aldeia Vermelha. “Em solidariedade com os povos da Teia da Bahia que estão passando dificuldades com as chuvas e os alagamentos fizemos um chamado para os territórios da Teia do Rio Grande do Sul a fim de recolher sementes crioulas e fortalecer ofertando essa diversidade”, explicou Jean Phillipe, do Junana. Para ele, é uma forma também de fortalecer o diálogo entre os territórios que compõem as Teias. “É a união de diversos territórios, de diversas regionalidades”.
Uma das surpresas do mutirão foi o interesse e disposição de um dos filhos de Rita à fotografia. Kawã Muniz Tupinambá pegou a câmera em alguns momentos e fez os registros abaixo. Admire e fica o chamado: caso você tenha uma câmera disponível em casa e queira ofertar ao Kawã, fale comigo. Seria uma contribuição ao futuro do jovem e também uma contribuição ao registro e à comunicação indígena.
Na lida agroflorestal, a orientação de Mestre Joelson Ferreira e a energia da juventude do Assentamento Terra Vista e das e dos visitantes. A juventude também chegou junto no samba de roda, na capoeira. Um salve também a quem rachou lenha, contribuiu na cozinha, na limpeza, somou da maneira que foi possível, na prática e no espiritual. Abaixo alguns registros desta movida, de volta no olhar de Alass Derivas – Deriva Jornalismo.
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